terça-feira, 15 de março de 2016

Mario Soler e seu artigo no Diário " O dia em que o "Diário" saiu de ponta-cabeça"


Minha coluna no Diário da Região homenageia os craques do traço
 (chargista, caricaturista, desenhista... dê o nome que você quiser).

O DIA EM QUE O 'DIÁRIO' 
SAIU DE PONTA-CABEÇA

Mário Soler
Tenho fascínio pelo trabalho dos cartunistas. Admiro o traço perfeito, a capacidade de expressão por mensagem curta, direta e inteligente, capaz de despertar, ao mesmo tempo, o riso e o olhar crítico do leitor.
Não escondo que sinto uma ponta de inveja desses caras geniais. Não sei desenhar nada, nem aquelas casinhas amarelas, com uma portinha e duas janelas, um caminho tortuoso na frente, uma represa no fundo, árvores e bichos pelo quintal. Sou um fiasco nessa matéria, zero em desenho.
Divirto-me com tirinhas, charges, caricaturas, enfim, todo tipo de traço.
No extinto jornal “Dia e Noite” (1976/1980) admirei caras geniais, como o Jave (não consigo saber por onde ele anda) e o Luiz de Lucca, um revolucionário do design gráfico numa época em que todos os jornais do mundo se pareciam com o Estadão de hoje. Eram comportados, com as notícias empilhadas como tijolos em colunas na capa, fotos discretas e uma manchete principal.
Foi nessa época que conheci um moleque arteiro, recém-chegado de um intercâmbio nos EUA, e que viajava de carona entre a casa dos pais, em Nova Granada, e a sede do jornal em Rio Preto, de nome esquisito: Ralfo Furtado.
O rapaz até tentou ser magnata de jornal. Criou o satírico “Estopim”, distribuído na região da Grande Nova Granada, que incluía a pequena Rio Preto. 
A irreverência atraía leitores na mesma proporção em que espantava os anunciantes. Aguentem aí que já-já eu conto o que esse menino aprontou numa madrugada na gráfica do “Diário da Região”. 
Quando achei que já tinha visto de tudo em matéria de jovens arteiros, e criativos, eis que aparece um rapaz tímido na redação do “Diário”. Quem me apresentou a fera foi o Milton Rodrigues, então editor de esportes.
O cartão de visita do desenhista era uma caricatura do time do América, que na época batia um bolão. Fiquei impressionado com a perfeição do desenho, feito numa folha de papel sulfite, creio que a guache. Também chamava a atenção o tamanho da assinatura do autor. Eu disse a ele:
- Lézio Jr, isto aqui é muito bom! Mas você poderia assinar seu nome menorzinho, não acha? Pense nisso!
Saí do jornal e, felizmente, o Lézio mergulhou de vez na redação, para o bem do jornalismo. O menino ganhou luz própria e hoje acumula prêmios nacionais e internacionais. Algumas de suas caricaturas valem por uma aula de política.
E o que é que o título desta coluna tem a ver com o que contei até agora? Voltemos ao irreverente Ralfo.
O tal jornal Estopim transformou-se numa página do Diário da Região, que saía sempre aos domingos. Num sábado, quase meia-noite, o rapaz fez plantão na oficina do jornal e conseguiu apoio de amigos da gráfica para fazer pegadinha. Montou sua coluna de cabeça pra baixo e esperou até ver o jornal impresso.
No dia seguinte, ao chegar à contracapa do jornal, os leitores topavam com a página invertida e uma manchete gritando:
“Extra! Inédito! Nesta edição, todo o Diário da Região de ponta-cabeça!”
- Na segunda-feira, fui chamado para uma reunião com o chefe da redação Vislei Bossan e os diretores Mazinho e Marinho – conta Ralfo. O dono do jornal, Dr Norberto Buzzini, meio rindo, meio sério, disse: “se você fizer uma coisa assim de novo, eu viro a sua cabeça”.
A julgar pelas risadas dos diretores e pelo número de cartas do leitor recebidas na redação a arte foi perdoada.

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